23 agosto 2017

À janela

José Blanc de Portugal

Eles estão fazendo alguma coisa ainda
que sem, a meu ver, sentido algum...
Eu vou deixando riscos no papel para entreter
a mão que busca o traço perdido.
Esse era o fito que eu inventara agora
mesmo em que isto vou escrevendo.
Mas que verdade isso representa neste
novo instante em que o que escrevi vou lendo?
Que busca a mão?
Formas de letras ligadas em palavras,
ou um volume vivo e morno, humanizado,
que um dia sentiu?
As palavras são-me um enigma
tão insolucionado como a razão da beleza
do contorno das serras que me ligam a
água e o céu que avisto desta margem
da baía em que o contemplo.

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1986.

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