27 outubro 2014

Somos de barro

Sebastião da Gama

Somos de barro. Iguais aos mais.
Ó alegria de sabê-lo!
(Correi, felizes lágrimas,
por sobre o seu cabelo!)

Depois de mais aquela confissão,
impuros nos achámos;
nos descobrimos
frutos do mesmo chão.

Pecado, Amor? Pecado fora apenas
não fazer do pecado
a força que nos ligue e nos obrigue
a lutar lado a lado.

O meu orgulho assim é que nos quer.
Há-de ser nosso o pão, ser nossa a água.
Mas vencidas os ganham, vencedoras,
nossa vergonha e nossa mágoa.

O nosso Amor, que história sem beleza,
se não fora ascensão e queda e teimosia,
conquista... (E novamente queda e novamente
luta, ascensão... ) Ó meu Amor, tão fria,

se nascêramos puros, nossa história!

Chora sobre o meu ombro. Confessámos.
E mais certos de nós, mais um do outro,
mais impuros, mais puros, nós ficamos.

Fonte: Silva, A. C. & Bueno, A., orgs. 1999. Antologia da poesia portuguesa contemporânea. RJ, Lacerda Editores. Poema publicado em livro em 1953.

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