03 julho 2014

Questões morais

Michael Ruse

Devemos começar com a mais básica de todas as questões. Estamos usando a evolução para podermos compreender e talvez justificar a moralidade – a questão situada no cerne da ‘ética’. Que é exatamente essa moralidade, foco de nosso interesse? A grosso modo sabemos naturalmente o que ela é. A moralidade se refere a diretivas para a vida, a obrigações. Ao que devemos e não devemos fazer. Mas, uma vez que nos vamos estender largamente sobre o assunto, poderíamos talvez explicar mais claramente a natureza formal da moralidade? A primeira pergunta que faço é sobre o seu significado. Quais seriam os critérios para que uma frase possa ser classificada como uma declaração moral? Em breve passarei a falar sobre conteúdo e evidência. [...]

Muito tem sido escrito a respeito de como separar o pensamento e a linguagem moral do pensamento e da linguagem não-moral. Um bom ponto de partida é a universalidade da moralidade, ou antes, a universalidade de toda reivindicação feita em nome da moralidade [...]. Em uma asserção de ordem moral pretendemos num certo sentido ir além do individual. Consideremos uma declaração tida por todo mundo, sem qualquer ambigüidade, como moral: “Você não deve estuprar meninas pequenas”. Embora, como é o caso em questão, eu esteja me referindo a um indivíduo em particular, o que torna moral a declaração é que ela se apóia numa proibição universal: “É errado para você, ou eu, ou, quem quer que seja, estuprar meninas pequenas”.

O que está sendo dito aqui é algo que se acha acima dos desejos do leitor, ou dos meus, ou dos de qualquer outra pessoa. Se o leitor me dissesse (sinceramente) que desejava estuprar uma menininha, isso não faria diferença no que se refere ao fato de que o estupro é errado, de que eu o consideraria errado, ou (e isso é importante) de que eu acho que o leitor deveria considerá-lo errado. Em outras palavras, a moralidade não é só uma questão de crenças e inclinações pessoais. Trata-se se algo que se aplica a todas as pessoas – pelo menos a todas as pessoas responsáveis que podem ser consideradas como agentes morais. [...]

Fonte: Ruse, M. 1995. Levando Darwin a sério. BH, Itatiaia.

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