17 outubro 2007

Palestra

Charles Baudelaire

És um belo céu de outono, tão clara e rosa!
Mas sobe em mim a tristeza como mar largo
E deixa ao refluir, nesta boca morosa,
A acre recordação do lodo mais amargo.

– Passas em vão a mão por meu peito que feres;
O que ela busca, amiga, é um lugar que varreram
A garra e o dente atroz de todas as mulheres.
Procuras coração que as bestas já comeram.

A minha alma é um palácio em que a azáfama estua;
Voa o cabelo ao ar; há embriaguez e morte,
– Nada o aroma em redor de sua nuca nua!...

Assim o quer, Beleza, este flagelo forte!
Com teu olhar de fogo, ardente como esferas,
Calcina o que escapou à crueza das feras.

Fonte: Baudelaire, C. 2006. As flores do mal. SP, Martin Claret. Poema originalmente publicado em 1861.

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